O ano de 2015 comeΓ§a sob enorme expectativa quanto ao segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff. As perspectivas, porΓ©m, sΓ£o positivas, considerando, entre outras coisas, a sua maturidade e experiΓͺncia, sobretudo a serenidade e o equilΓbrio com que enfrentou a ameaΓ§a de impeachment, alΓ©m de conseguir imunizar-se de respingos da OperaΓ§Γ£o Lava-Jato que, ao contrΓ‘rio do que esperavam a oposiΓ§Γ£o e a mΓdia comprometida, em nada afetou a sua popularidade e a confianΓ§a do brasileiro em sua administraΓ§Γ£o, conforme atestaram recentes pesquisas. Dilma, na verdade, atΓ© cresceu na avaliaΓ§Γ£o da populaΓ§Γ£o, que pode nΓ£o aprovar todos os seus atos, mas nΓ£o tem nenhuma dΓΊvida quanto a sua honestidade.
A Presidenta reeleita, no entanto, terΓ‘ pela frente pelo menos trΓͺs grandes desafios em seu novo mandato: os projetos de reforma polΓtica, de regulaΓ§Γ£o da comunicaΓ§Γ£o e da mudanΓ§a na Lei da Anistia. Ela precisarΓ‘ enfrentar nΓ£o apenas a fΓΊria da oposiΓ§Γ£o, em especial do PSDB, que nΓ£o se conforma com a derrota nas eleiΓ§Γ΅es de outubro ΓΊltimo como, tambΓ©m, a campanha sistemΓ‘tica da chamada Grande Imprensa, que nΓ£o tem lhe dado trΓ©gua desde o inΓcio do seu primeiro mandato e promete fogo mais intenso diante do temor de, com a nova lei, ter de responder pelos seus excessos. Agora um pouco mais distante da influΓͺncia do ex-presidente Lula, segundo avaliaΓ§Γ£o de observadores estribados no perfil do seu novo ministΓ©rio, Dilma terΓ‘ que exercitar toda a sua habilidade polΓtica e consolidar sua maioria no Congresso Nacional para garantir a aprovaΓ§Γ£o das suas propostas.
O primeiro desafio a ser enfrentado, logo no inΓcio do seu segundo governo, serΓ‘ a eleiΓ§Γ£o do novo presidente da CΓ’mara Federal. O candidato do Planalto, deputado Arlindo Chinaglia, do PT, que jΓ‘ foi presidente da Casa, terΓ‘ pela frente o deputado Eduardo Cunha, do PMDB, que adotou um comportamento oposicionista, mesmo integrando a base aliada, lanΓ§ou-se candidato Γ revelia do governo e da direΓ§Γ£o do seu prΓ³prio partido e conseguiu o apoio da oposiΓ§Γ£o. Aparentemente, a julgar por suas ΓΊltimas declaraΓ§Γ΅es condenando qualquer tentativa de impeachment da Presidente, ele estΓ‘ buscando eliminar as restriΓ§Γ΅es do governo Γ sua candidatura e atrair as suas simpatias, mas Γ© difΓcil prever as suas atitudes depois de eleito, considerando a sua afinidade e proximidade com os oposicionistas. E se nΓ£o quiser ter dificuldades na CΓ’mara Dilma precisa de um presidente da sua confianΓ§a.
Ao mesmo tempo ela necessita, tambΓ©m, administrar o bombardeio da imprensa que, municiada pelos vazamentos seletivos da OperaΓ§Γ£o Lava-Jato, faz pressΓ£o para a demissΓ£o de GraΓ§a Foster da presidΓͺncia da PetrobrΓ‘s. Com mais muniΓ§Γ£o fornecida pela ex-gerente Venina da Fonseca, transformada em heroΓna em meio a grande exposiΓ§Γ£o na televisΓ£o e nas pΓ‘ginas dos jornalΓ΅es familiares, a mΓdia oposicionista insiste em desvalorizar e fragilizar a PetrobrΓ‘s com a clara intenΓ§Γ£o de criar as condiΓ§Γ΅es indispensΓ‘veis Γ sua privatizaΓ§Γ£o, um velho sonho acalentado pelos tucanos desde o governo de Fernando Henrique Cardoso. O jornal "O Globo", por exemplo, jΓ‘ escancarou a sua posiΓ§Γ£o, defendendo em editorial a entrega do prΓ©-sal, justamente o filΓ© de nossas reservas petrolΓferas, para empresas estrangeiras de exploraΓ§Γ£o de petrΓ³leo. Acredita-se, no entanto, que enquanto o PT estiver no Planalto isso nΓ£o acontecerΓ‘, mas jΓ‘ hΓ‘ quem tenha dΓΊvidas diante do projeto de abrir a Caixa EconΓ΄mica para o capital privado.
Os escΓ’ndalos na PetrobrΓ‘s, que oposiΓ§Γ£o e mΓdia imaginavam ser o trunfo que faltava para apear Dilma do Planalto, nΓ£o provocarΓ£o a queda da Presidenta, mas serΓ£o de fundamental importΓ’ncia para produzir mudanΓ§as na legislaΓ§Γ£o, de modo a permitir, mediante novos mecanismos, um combate mais eficaz Γ corrupΓ§Γ£o. E Dilma, que assegurou maior autonomia Γ PolΓcia Federal para investigar e prender corruptos e corruptores, deverΓ‘ ter um papel relevante na construΓ§Γ£o do novo Brasil que surgirΓ‘ apΓ³s a OperaΓ§Γ£o Lava-Jato. AlΓ©m disso, deverΓ‘ ter mais cautela na indicaΓ§Γ£o dos novos ministros do Supremo Tribunal Federal, para que nΓ£o surjam outros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, que marcaram sua atuaΓ§Γ£o mais como polΓticos do que como magistrados. NinguΓ©m quer – e muito menos a Presidenta – ministros que, em suas sentenΓ§as, revelem gratidΓ£o, mas apenas que sejam, efetivamente, justos e ajam realmente como magistrados.
A Presidenta, por outro lado, terΓ‘ que mostrar firmeza em sua disposiΓ§Γ£o de aprovar o projeto de regulaΓ§Γ£o da mΓdia, de modo a que a liberdade de imprensa seja exercida com responsabilidade. NinguΓ©m aprova qualquer tipo de censura – a prΓ³pria Dilma, que sofreu na pele os efeitos danosos da suspensΓ£o da liberdade de expressΓ£o durante a ditadura, sempre defendeu uma imprensa livre – mas nΓ£o se pode mais aceitar que reputaΓ§Γ΅es sejam destruΓdas impunemente em nome dessa liberdade, que nΓ£o tem limites na manipulaΓ§Γ£o de informaΓ§Γ΅es para atingir determinados objetivos polΓticos. A grande maioria do povo, aliΓ‘s, jΓ‘ deu mostras de que nΓ£o aceita esse tipo de imprensa e a prova mais evidente disso Γ© a situaΓ§Γ£o da revista "Veja" que, habituada a distorcer os fatos, vem perdendo credibilidade e leitores, o que a deixou agonizante. Os jornalΓ΅es estΓ£o trilhando o mesmo caminho, razΓ£o porque os blogs cresceram de importΓ’ncia como alternativa de informaΓ§Γ£o e a internet ganhou forΓ§a.
A reforma polΓtica, uma exigΓͺncia da prΓ³pria populaΓ§Γ£o, vai obrigar a Presidenta a verdadeiras acrobacias para garantir a sua aprovaΓ§Γ£o, jΓ‘ que o seu projeto de realizΓ‘-la atravΓ©s de plebiscito encontra resistΓͺncia no Congresso, inclusive entre aliados como o senador Renan Calheiros, que defendem as mudanΓ§as, mas com a participaΓ§Γ£o direta do Parlamento. Existem ainda os que defendem uma Constituinte exclusiva para a reforma, o que dificulta o processo. Dilma terΓ‘ de agir com muita habilidade para conseguir realizar, neste segundo mandato, as mudanΓ§as tΓ£o reivindicadas, mas atΓ© hoje arrastando-se por diversos governos. Como essa reforma envolve diretamente os interesses dos parlamentares, ela precisarΓ‘ ter um bom relacionamento com o novo Congresso e superlativa capacidade de convencimento para assegurar o apoio da maioria nas duas casas legislativas.
A questΓ£o da mudanΓ§a na Lei de Anistia, no entanto, deverΓ‘ ser o maior desafio de Dilma em seu segundo mandato. Isto porque o trabalho da ComissΓ£o da Verdade tem desagradado a uma parcela dos militares, em especial a generais que participaram das aΓ§Γ΅es repressivas da ditadura e que, citados nos depoimentos, correm o risco de sentar no banco dos rΓ©us, como aconteceu na Argentina. Embora os atuais comandantes militares tenham assegurado fidelidade Γ Presidenta, ninguΓ©m sabe atΓ© onde vai a influΓͺncia na tropa dos generais de pijama. De qualquer modo, a questΓ£o deverΓ‘ ser conduzida com habilidade para evitar novos problemas, atΓ© porque a imprensa que hoje nΓ£o dΓ‘ trΓ©guas Γ Presidenta, chegando a estimular o seu impeachment, Γ© a mesma que apoiou o golpe militar de 1964 e nΓ£o se sabe como ela orientarΓ‘ o noticiΓ‘rio a respeito. Portanto, nΓ£o custa lembrar: cautela e caldo de galinha nunca fizeram mal a alguΓ©m.
RIBAMAR FONSECA
Fonte: http://www.brasil247.com/
