Caso HSBC: Mídia hegemônica sente o golpe


A mídia alternativa conseguiu uma vitória: depois de tentar ignorar o escândalo das contas de 8.667 brasileiros na Suíça, os jornalões foram obrigados a abordar o assunto graças às denúncias dos “blogs sujos” e sites independentes. Ainda que de forma enviesada, a mídia empresarial pelo menos fala agora no assunto, sempre buscando escamotear o principal da questão: quem são os titulares e que possíveis esquemas de corrupção irrigaram os 7 ou 8 bilhões de dólares destas contas?

A repercussão negativa foi tamanha que a “ombudsman” do jornal Folha de S. Paulo, Vera Guimarães Martins, foi escalada pela direção do jornal para uma espinhosa missão: tentar justificar o porquê do silêncio, em sua coluna publicada neste domingo (01). A tarefa era inglória e é forçoso reconhecer que, além disso, Vera Guimarães foi muito mal.

A “ingenuidade” da ombudsman

Vera reconhece que a divulgação do escândalo “foi seguida por uma cobertura modesta na grande imprensa”, e isso fez surgir o que ela chama de uma “teoria conspiratória”, espalhada por “militantes a soldo”. E qual a razão então da “cobertura modesta” de um escândalo de proporções internacionais? A jornalista a soldo da Folha justifica: “(a cobertura modesta) fez brotar aqui e ali acusações de que os jornais estariam omitindo-se para proteger políticos ou poderosos. A realidade é mais prosaica: os jornais levaram um furo na testa”. É isso mesmo que vocês leram. A cobertura foi modesta pois a mídia brasileira levou um furo. É mais ou menos assim: amanhã a Fox estadunidense faz uma reportagem especial anunciando que foi descoberta uma pílula para curar todos os tipos de câncer e como a mídia brasileira não foi a primeira a contar a novidade, ela (a mídia) fica embirrada e só toca no assunto a contragosto depois que todo mundo começa a reclamar. Mas depois desta “explicação” Vera ainda escreveu que “é ingenuidade ou desinformação achar que é possível a qualquer veículo, por maior que seja, manter em segredo uma grande história”. Não é verdade, Vera. A história do jornalismo está farta de casos de grandes escândalos encobertos desde que isso interesse às corporações empresariais midiáticas. Para refrescar a memória da jornalista, a última nota traz uma pequena relação de alguns escândalos abafados.

Os sofismas da ombudsman

Vera realmente não foi bem. Fez em sua coluna o pior tipo de sofisma, o que trata o interlocutor como imbecil. Logo no terceiro parágrafo, a ombudsman afirma que “No Brasil, a publicação (do escândalo) foi feita pelo blog de Fernando Rodrigues, que trabalhou na Folha por 27 anos e deixou o jornal em novembro último”. Vera insinua assim que o UOL, empresa para a qual Fernando Rodrigues (jornalista que está com a lista do HSBC) trabalha e que pertence ao grupo Folha, tem pouca relação com o jornal Folha de São Paulo, do mesmo grupo. É uma tentativa atrapalhada para explicar o segredo em torno da lista com os 8.667 nomes. Sem muita saída, ela mesma reconhece que “como integrante do mesmo grupo do UOL, a Folha poderia reproduzir as reportagens feitas por Fernando Rodrigues, mas não o fez” e “louva” a justificativa apresentada pela secretaria de redação do jornal: “Sem acesso próprio a um material que envolve quebra de sigilo bancário, o jornal preferiu relatar o que disseram as reportagens nos casos em que julgou relevante”. Quer dizer então que o grupo Folha não tem acesso a um material conseguido por um funcionário... do grupo Folha? E só neste caso a Folha de S. Paulo se preocupa com a “quebra de sigilo”? Preocupação no mínimo estranha para um jornal que não tem qualquer pudor em divulgar informações sob segredo de justiça quando se trata de atingir seus adversários políticos. E a ombudsman ainda termina dizendo que para que existam reportagens sobre o tema “é preciso que (os jornais) se virem para ter acesso ao material”. A Folha então tem que se virar para ter acesso a um material que já está com ela, ou na pior das hipóteses com um funcionário do próprio grupo Folha? Acha sofisma, acha “ingenuidade”, acha soldo.

Fernando Rodrigues e os critérios do grupo Folha

O jornalista Fernando Rodrigues, “dono” da lista do HSBC, em publicação no seu blog nesta segunda (2), não menciona uma palavra sobre a instalação da CPI do HSBC no Senado, boicotada pelos tucanos que se recusaram a assinar o requerimento pela sua criação. Mas informa com destaque que o PSDB na Câmara “irá requerer a convocação do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para que ele explique a atuação dos órgãos de controle vinculados à pasta em relação aos brasileiros que tinham contas no HSBC da Suíça”. Ou seja, para o jornalista um requerimento, que ainda sequer foi protocolado, é mais importante do que a existência de uma CPI sobre o tema, pois assim ele consegue auxiliar o PSDB a sair da defensiva em relação ao caso. Tem mais, no post desta segunda-feira (02), Rodrigues admite que “no final do ano passado, 2014, o Blog mostrou ao Coaf uma pequena relação preliminar, com cerca de 340 nomes de pessoas com contas no HSBC da Suíça e que têm ligação direta com o Brasil” e admite que “essa lista de 340 nomes representa perto de 3% do total das ‘contas brasileiras’ no SwissLeaks”. Se formos esperar pelos imparciais critérios do grupo Folha para conhecer os meandros deste escândalo, é melhor desde já nos acostumarmos com a ideia de que a espera pode ser infindável.

Uma lista para Vera

A ombudsman da Folha alega, como vimos, que é impossível para a mídia encobrir grandes escândalos. Vamos então lembrar apenas alguns dos que foram abafados:

1) Escândalo da tortura - A tortura e o assassinato de opositores do regime militar no Brasil da segunda metade da década de 60 e na década de 70 do século passado eram assuntos de conhecimento público, inclusive no exterior, que durante anos foram abafados pela nossa mídia e no caso da Folha de S. Paulo chegou ao ponto de o jornal emprestar seus carros de reportagens para transportar presos políticos rumo à tortura.

2) Escândalo SIVAM - Logo no início da gestão de FHC, denúncias de corrupção e tráfico de influências no contrato de US$ 1,4 bilhão para a criação do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) derrubaram um ministro e dois assessores presidenciais. Depois de um tempo nada mais se falava no assunto com o silêncio cúmplice da mídia hegemônica.

3) Escândalo da Pasta Rosa - Em agosto de 1995 eclodiu a crise dos bancos Econômico (BA), Mercantil (PE) e Comercial (SP). Através do Programa de Estímulo à Reestruturação do Sistema Financeiro (Proer), FHC beneficiou com R$ 9,6 bilhões o Banco Econômico numa jogada política para favorecer o seu aliado ACM. Uma pasta rosa que trazia o nome de 25 deputados subornados pelo banco Econômico sequer foi averiguada. O escândalo terminou em pizza com o silêncio cúmplice da mídia hegemônica.

4) Escândalo da Telebrás - Grampos no BNDES flagraram conversas entre Luis Carlos Mendonça de Barros, ministro das comunicações, e André Lara Resende, dirigente do banco. Eles articulavam o apoio a Previ, caixa de previdência do Banco do Brasil, para beneficiar o consórcio do banco Opportunity, que tinha como um dos donos o tucano Pérsio Árida. A negociata teve valor estimado de R$ 24 bilhões. Nada se apurou sob o caso. A mídia ficou quietinha.

5) Escândalo da venda da Vale – A Vale do Rio Doce foi vendida em 1996 por R$ 3,3 bilhões, quando seu valor de mercado era de mais de R$ 100 bilhões. Quem financiou a compra em condições excepcionalmente boas foi o BNDES. Trocando em miúdos, o governo da época vendeu um bem público por um preço aviltado e ainda financiou o negócio. Em 2006 a juíza Selene Maria de Almeida, do Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília, julgando um pedido de reabertura do caso sobre a privatização da Vale, considerou pertinente uma nova investigação sobre ocorrido e escreveu: “A verdade histórica é que as privatizações ocorreram, em regra, a preços baixos e os compradores foram financiados com dinheiro público”. A posição da juíza foi referendada pela 5ª turma do TRF, mas a mídia não transformou estes juízes em heróis, pelo contrário, abafou o caso, que deu em nada.

6) Escândalo da privataria – A privataria tucana já foi objeto de investigações de jornalistas e pesquisadores que trazem provas irrefutáveis sobre como a corrupção foi um fator dominante no processo, desviando bilhões de reais dos cofres público. Nada foi investigado. A mídia abafou e abafa até hoje.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/

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